TAYANE SANSCHRÍ

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Reticências

“Podias ter-me dito que ias sair da minha vida. Abria-te a porta e dizia-te adeus, como se faz a um velho amigo que vive noutro país e vem visitar-nos uma vez por ano. Dava-te um longo e quase triste abraço e pedia às estre­las que te protegessem ao longo de todas as viagens até ao fim da vida.
Podias ter-me escrito uma carta, um e-mail, uma mensagem. Podias ter mandado um ramo de flores ou uma caixa de sementes com um cartão a dizer desculpa. Eu teria perdoado porque não há nada para perdoar. A paixão é mesmo isto, nunca sabemos quando acaba ou se transforma em amor, e eu sabia que a tua paixão não iria resistir à erosão do tempo, ao frio dos dias, ao vazio da cama, ao silêncio da distância.
Há um tempo para acreditar, um tempo para viver e um tempo para desistir, e nós tivemos muita sorte porque vivemos todos esses tempos no modo certo.
E agora que o Inverno se instalou, espero paciente­mente que as sementes resistam ao frio e encham o meu jardim de cores e de cheiros quando a Primavera chegar. Imagino que me escondo debaixo da terra com elas, são muitas e pequenas, mas guardam a essência da vida, e a felicidade é isto: plantar o que sentimos e esperar, dei­xar correr os dias até passarem semanas, e aguardar que estas se alinhem em meses, ser paciente, não cobrar nem desistir, seguir em frente e desejar o melhor do mundo àqueles que amamos.
Podias-me ter dito que querias conjugar o verbo desis­tir. Não sei como se diz desistir na tua língua nem quero aprender, porque na minha demorei muito tempo a acei­tar que, às vezes, desistir é o mesmo que vencer sem tra­var as batalhas. Antigamente pensava que não, que quem desiste perde sempre, que a subtracção é a arma mais covarde dos amantes, e o silêncio a forma mais injusta de deixar fenecer os sonhos. Mas a vida ensinou-me o contrário. Hoje sei que desistir é apenas um caminho possível, às vezes o único que os homens conhecem.
(...)
Sei que também aprendeste muito comigo, mais do que imaginas e do que agora consegues alcançar. Só o tempo vai te dar tudo o que de mim guardaste, esse tempo que é uma caixa que se abre ao contrário: de um lado estás tu, e do outro estou eu, a ver-te sem te poder tocar, a abraçar-te todas as noites antes de adormeceres e a cada manhã que acordares."

                              (Retirado do Blog: Uma vida...sem sentido)

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