TAYANE SANSCHRÍ

terça-feira, 13 de abril de 2010

Espinhos e Aconchego


A metáfora dos porcos-espinhos, apresentada por Arthur Schopenhauer em "O mundo como vontade e representação", livro IV, é antiga - e perfeita. Vale a pena relembrar a fábula do filósofo alemão:

Um grupo de porcos- espinhos perambulava  num dia frio de inverno. Para não congelar, os animais chegavam mais perto uns dos outros. Mas, no momento em que ficavam suficientemente próximas para se aquecer, começavam a se espetar com seus espinhos. Para fugir da dor, dispersavam-se, perdiam o benefício do convívio próximo e recomeçavam a tremer, o que os levava a buscar novamente a companhia uns dos outros - e o ciclo se repetia: a luta para encontrar uma distância confortável entre a dor e a proximidade.

A história nos lembra uma verdade inevitável quanto incômoda: por mais necessário, prazerosos e reconfortantes que sejam, os relacionamentos causam desconfortos. O que fazer, então? Uma das saídas propagadas por alguns psicoterapeutas é que a pessoa se volte para si sem se preocupar com o que o outro sente ou pensa, fazendo exclusivamente aquilo que oferece satisfação a ela - e nada por obrigação. A operação, porém, é de alto risco: magoar (e perder) pessoas queridas. O oposto - anular-se e viver em função de anseios alheios - obviamente também não é adequado. O grande desafio é cultivar a flexibilidade e o equilíbrio nos inúmeros relacionamentos dos quais não se pode fugir (considerando aqui desde o superficial encontro diário com o ascensorista do prédio onde trabalhamos, até a intimidade afetiva,delicadamente construída com as pessoas queridas, passando pelas relações familiares, fraternas, profissionais e pelas escolhas amorosas).

O bom é que as feridas psíquicas cicatrizam. E o aprendizado do ofício e da arte de estar perto sem machucar (a si ou ao outro) se renova a cada dia...

              (Por Gáucia Leal - editora da Revista Mente e Cérebro)

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